COMO VOCÊ SE SENTIRIA SE VIRASSE UM NÚMERO?

Certa vez, em um hospital geral, fui chamada para atender um paciente internado na enfermaria de ortopedia, que, segundo a equipe técnica, “estava deprimido, pois quase não falava e não se alimentava”.

Durante o atendimento contou-me que estava com grande dificuldade, pois, por não ter um pedaço do seu estômago, não conseguia se alimentar direito, visto que necessitava comer em pequenas porções durante várias vezes ao dia e não, como estavam sendo servidas as refeições, em grandes porções e em horários padronizados. Perguntei se havia falado sobre aquilo com alguém e ele respondeu que não, porque as pessoas ali não lhe davam muita chance para falar.
Não é necessário dizer que, depois deste atendimento, foi realizada uma dieta adequada para aquela pessoa e, consequentemente, a “depressão” passou.
Pensar que, este exemplo, foi um descaso, por parte de uma equipe técnica, é simplificar a questão, pois todos estavam preocupados com o paciente. Tanto é verdade que chamaram o psicólogo.

A falha, neste caso, adveio da concepção de corpo, mente, saúde e doença que cada um carregava dentro de si. O médico cuidaria somente de sua especialidade, a enfermeira executaria a assistência médica prescrita e a nutricionista receitaria a dieta de acordo com a doença (no caso, uma fratura) que levou o paciente a se internar. Por outro lado, manter-se passivo, ignorar-se como proprietário responsável de seu corpo, também era um paradigma dos pacientes internados naquele hospital público. Enfim, aquela pessoa não estava sendo vista pelos profissionais e nem por si mesma como um ser inteiro, mas como um ser em pedaços.

E sem falar que a política de saúde pública implantada em nosso país preza pela quantidade – a produtividade – e não pela qualidade, portanto, os profissionais não têm tempo para “muita” conversa. Isto torna você cada vez mais apenas um número associado a um órgão doente.
A propósito, o caso acima foi do paciente de nome “Leito 7”, e de sobrenome “Fratura do Fêmur”.

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